boa noite Lua...
amiga e cúmplice.
Crônicas de um Amaldiçoado - Gênesis
Pelas ruas, a noite espreita seus passos desajeitados, suas pegadas que somem por poças que molham ainda mais o tênis. Cadarços desamarrados que o fazem tropeçar intercalando tombos e descuidados gestos de falta de equilíbrio. Aparentemente um incauto e indefeso inocente às entidades noturnas que já abrem suas bocas e salivam, ansiando pelo gosto da presa.
O vento sopra, a chuva torrencial diminui o
ritmo. No entanto continua a cair, o vento dá enfim uma trégua, mas boceja um
último suspiro, suficiente para tirar parte das mechas do longo e mal cortado
cabelo, ainda encharcado, do seu rosto, revelando um olhar atônito, porém de
pura e completa adoração: A Lua, ele foca.
Nada mais curioso, pois após alguns segundos,
seus movimentos, que semelhantes aos anteriores, sem equilíbrio algum, fazem,
agora, parte de uma circularidade de continuas ações, desconexas e absurdas.
Confusas, porém firmes. O asfalto molhado salta parte de uma borra espessa que
se prende ao solado de seu All Star vermelho de cano longo, os cadarços puídos
voam em um giro frenético. Seus braços e mãos fazem parte importante da dança
lunática, dando um ar grotesco, mas, ainda assim, ridículo. Sua capa de chuva,
que por si apenas resta o nome, com os buracos e as bordas gastas, não
protegem em nada contra o volume d'água.
Por meio de vocalizações que se assemelham
aos dos animais ele se entrega a este transe animalesco, este frenesi
alucinado. E, por fim, termina em reta postura, de braços abertos e, subindo a
fronte com um semblante completamente sinistro.
Uma risada, como um bufão relembrando uma
piada, talvez até quem saiba que não a fosse. Racha o silêncio imposto pelo
termino da chuva, pois, sim, ela já havia cessado. E, no entanto, tal figura
esquisita, se põe a reverenciar algo, fazendo pender sua fronte novamente, e ao
completar o movimento a chuva, curiosamente, volta a cair.
Então, mais do que de repente, suas palavras,
como um mesclado de sublime canção e mórbido réquiem, se fazem audíveis,
advertindo:
- se estão à esperar algo, penso que o que
desejam ou temem é motivo o suficiente para me encurralarem... - ele diz, e
continua após uma pausa poeticamente arquitetada: -... no entanto, a
dúvida que os aprisionam, não concerne à isso, mas ao fato de... se ao tentarem
poderão arcar com a consequência futura de tal feito?!
Os rugidos e perigosas
bocas que dantes o seguiam, emergem com o intuito de ameaçar. Enxergando, o outrora cambaleante incauto, agora, ereto, de bom porte, e
proferindo em tom indulgente, ameaças afiadas, paralisam-se.
Não era o suficiente, apenas um instinto, que
de tão mínimo e insignificante não os deu margem à atentarem. Deixaram sua
natureza ser sobreposta pela sua arrogância de predadores noturnos, entretanto
o engano foi o crucial erro. O engodo era perfeito, a situação metodicamente
arquitetada e o perigo esquecido agora tomava conta de suas vontades. Antes
vorazes, agora paralisados. Quem sabe se pela presença do tal lunático, ou o
medo que agora permeava o ar.
Num instante, eles se renderam a sensação do
inevitável. A fuga havia sido frustrada. Desde o início a trama apenas os
deixaram enebriados pela medíocre aparência do tal louco, mas agora, não
escapariam de sua sanha.
A ilusão se desfizera.
Minutos depois do
arrependimento, jaziam, suas entranhas pelas calçadas, ossos e partes de carne
crua e empapada em sangue sob as entradas do esgoto por ondem saía fumaça.
Elevando o cheiro de doce do humor rubro
pelos céus, era sim um festim.
E no qual a vida tirada não era da presa, mas
do mortífero caçador, ou apenas fazia parte da farsa do insano desde o
princípio.
Ironias noturnas.
Continua.
Excelente !
ReplyDeleteSensacional! Consegui ver a "cena" perfeitamente. Só senti falta de uma coisa: Do combate. Porém entendo que a intenção do texto era de ser curto e os detalhes do combate o deixariam enorme.
ReplyDeleteMas parabéns, cara! E continue de verdade. Quero ler o resto.
Valeus Caião, continuarei e você lerá com certeza.
Deletep.s.: quer combate, combate você terá!!!
Adorei!
ReplyDeleteMuito bom! o fato de vc nao ter narrado a batalha nao me impediu de imaginar.
ReplyDeletevaleu Pedrão o/
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